MOÇA, TE PRECISAM LINEAR

Seu corpo não pode ter tantas curvas. Mas, sem curva nenhuma, também não aceitam. Tem que andar na reta do que te é imposto. Veja bem, a linha também tem cor: é branca. A linearidade da sua experiência vai te dizer também como precisará ser a sua identidade e sua sexualidade.

Quanto ao seu útero, mais regras lhe serão impostas: não pode engravidar quando jovem e, para que não aconteça, cabe a você usar métodos contraceptivos. Eles serão importantes para que você também não reclame de cólicas ou viva oscilações de humor. Te precisam linear para que seu trabalho seja feito, para que não precisem temer suas percepções e emoções. Você deve ser previsível.

As fissuras, entretanto, se você mantiver os olhos bem abertos, estão por aí também: a linearidade não é a nossa essência. Por mais que a propaganda capitalista te prometa uma velhice confortável (caso você trabalhe bastante durante a juventude), há mais do que isso nas entrelinhas existenciais. Na selva de pedra das cidades, ainda voam alguns pássaros e resistem algumas árvores. A natureza, sábia e paciente, ensina a essência cíclica das coisas: vida, morte e vida novamente. 

Dentro de nossos úteros, vivemos igual: ovulação, menstruação, ovulação. Da movimentação natural de nossos corpos, brotam as energias necessárias para seguirmos o fluxo da vida que importa. Os hormônios dançam a favor do que se deve fazer. Estrogênio primeiro, convidando à criação; progesterona por fim, incentivando o descanso. Moça, diferente do que te disseram, é possível e merecido que se descanse na jornada.

Te precisam linear, eu sei. Para que você não sinta seu corpo convidando ao repouso, para que você não use da sua potência libidinal e para que não viva a TPM (Tempo Para Mim). Caso você esteja emotiva demais, te dirão que é pré-menstruação, tirando-lhe o direito de ter senso crítico ou emoção. E grande parte da Psicologia, infelizmente, confirmará essa acusação; porque te precisam produtiva e dócil, adormecendo seu útero em diagnósticos até que seja a hora de usá-lo.

Pois lhe digo, moça: a nossa mente pode ser docilizada. A gente pode acreditar que é preciso se forçar ao trabalho e à estabilidade emocional o tempo todo. Mas o corpo não atende aos mesmos comandos. Ele é a ponte que temos com a natureza. Ele não responde à linguagem, à verbalização, ao capitalismo. Será ele a nossa bússola para entender quando a linha está nos desviando demais de nós. Sintomas são pedidos de ajuda que, com sorte, nos acordarão.

Não conseguiremos jamais caminhar em linhas tão retas tal qual as que nos impõem. Nossos pés ditarão seu próprio ritmo. O ciclo menstrual, por sua vez, seguirá determinando o que é vivo e o que é morto, o que é luz e o que é sombra, o que é você e o que é o outro. Mesmo medicado, silenciado, ignorado. Dele, seguirá escorrendo o rio que nos banha e nos revigora.

Moça, te precisam linear porque sabem que você carrega a potência da natureza dentro do útero. É hora de parir revoluções.


Fernanda Zeloschi é estudante de Psicologia e, quando ninguém está olhando, escreve e compartilha seus questionamentos e descobertas na página @fazerafetar.


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