Os dias atuais não nos permitem refletir, ao mesmo tempo em que nos convidam a opinar. Eis o problema que germinou todo o caldo de incompreensão e ódio que toma conta das redes sociais e se dissemina pela sociedade. E qual a estranheza ao se pensar que, veja bem, o problema já não parte do corpo social para o virtual, como era quando surgiram as primeiras tecnologias eletrônicas. Nasce da virtualidade vivida para ganhar materialidade no dia a dia.
Trocando em miúdos, ainda não sabemos como lidar com tantas mamadeiras eróticas e bandeiras do Brasil, gente dançando ao som de axé pelo impeachment, de um lado, e de outros infinitos debates sobre limites e direitos do corpo, transformação da palavra “hétero” em pejorativo etc. E, ao não sabermos, germinamos, os dois lados desse binômio antissocial que se formou no Brasil desde junho de 2013, o dado material dessa tessitura de aversões e conflitos: Jair Bolsonaro.
Para sair dessa encalacrada, é preciso pensar. É preciso refletir não nos memes do Facebook e das stories de Instagram, mas entre nós, em espaços reais de pensamento em diálogo, que possam chegar às pessoas e contribuir para a construção em conjunto de uma sociedade melhor. Por isso, decidi aderir ao projeto da revista Trama_, que se propõe a discutir a sociedade a partir da cultura, da arte e da filosofia, dentre outros, no atual e necessário ambiente digital (onde estão hoje concentrados os diálogos), mas também no indispensável papel, aquele que conserva, documenta, onde o conteúdo verdadeiramente não se perde e pode ser tocado. Que não tem apenas luz e imagem, mas textura, cor, cheiro. Afeto.
E coerente a este argumento, de ser necessário trazer o novo para coexistir, não destruir, venho propor a discussão dos saberes clássicos e de como suas propostas podem, ainda, nos ajudar a compreender e solucionar os problemas de hoje. Sabemos serem Butler, Foucault, Deleuze, Preciado, Küng, autores contemporâneos que muito têm a dizer e que refletiram já à luz de Freud, Kant, Descartes, regressando até Platão e Aristóteles. Entretanto, sem passar pelos primeiros sábios, torna-se vazia a discussão desses últimos, tornando o aprendiz não um dialogante, mas um absorvente de seus pensamentos. Para debater, concordar e discordar na prateleira de cima, é preciso partir da base.
O problema é que os dias são corridos, pessoas têm que sair cedo para trabalhar, chamar o Uber (já nem o ônibus está aguentando a concorrência…), bater o ponto, outras correr para o notebook e fazerem-se prisioneiras de um escritório na própria casa, enquanto deixam criança na creche ou aos cuidados da empregada, e assim vai. Como discutir filosofia para tentar resolver os problemas da sociedade sendo que, nesse mundo individualizado, resolver os nossos problemas já requer três quartos do dia?
Para isso vêm à tona projetos como Trama_, ainda mais deixando o palheiro do ambiente virtual para coexistir como blog e revista, assim capilarizando-se materialmente pela sociedade para tentar espalhar reflexões de diversos autores sobre temas variados, todos no objetivo de entender quem somos e o que queremos para o ambiente em que construímos nossas vidas. Concordando e discordando das opiniões aqui assinadas, nós nos informamos, acima de tudo.
E, neste espaço, desde agora e a partir das próximas semanas, eu, Hélio Rocha, pretendo contribuir com o debate sobre os antigos. Aqueles a quem consideramos superados. Os que não estão mais nas salas de aula das universidades, salvo disciplinas específicas. Os que não estão nos teatros, nos filmes, nas mostras de arte, mas foram a base para que se estabilizasse a cultura em que vivemos.
Bem-vindos de volta, de Parmênides a Hobsbawm. Aqui, vocês serão discutidos.
Hélio de Mendonça Rocha é jornalista. Atua como repórter de meio ambiente e direitos sociais para a revista Plurale e como analista político para os jornais Brasil 247 e El Siglo de Chile. Foi correspondente internacional na China em 2019
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