A história da arte não pode ser dividida em blocos isolados e concretos, assim como a da fotografia. Entretanto podemos apostar em características de momentos distintos, marcados por diversas questões, como as políticas e as afetivas.
Em um momento mais remoto, é possível encontrar um anseio da fotografia em registrar o espetacular e ser um inventário do mundo. Hoje, as imagens gritam até não serem mais ouvidas e seu impacto é diferente, porque são muitas e, talvez por isso, não comoveriam da mesma forma que antes.
A produção exaustiva anestesia o olhar, porém aponta para buscas diferentes. A fotografia contemporânea traz à tona o que não é mais visto, o incidente. No livro “Imagens Contemporâneas do Sublime”, Denílson Lopes discute a ideia do sublime: “À medida que cada vez mais o grandioso, o monumental pode ser associado à arte dos vencedores, de impérios autoritários, da arte nazista, do Realismo Socialista aos épicos hollywoodianos, é justamente no cotidiano, no detalhe, no incidente, no menor que residirá o espaço da resistência, da diferença”.
O ensaio
As imagens foram realizadas em viagens entre o ano de 2017 e 2018. Em uma proposta comum à fotografia contemporânea, elas não registram o monumental ou um inventário de paisagens. Pelo contrário, trabalham conceitos e afetividade de outra forma para além da simples contemplação. O ensaio mostra ao espectador as vitrines de açougues pela Europa. Por um lado, as carnes iluminadas se tornam elementos plásticos. Por outro, podem gerar o asco.
Sobretudo, os cliques surgiram pelo incômodo da fotógrafa, mulher negra latino-americana que se viu em outro território, rodeada por memórias de um passado colonial como o suntuoso “Marco dos Descobrimentos” em Portugal e por incontáveis situações de xenofobia e hipersexualização de seu corpo. Situação na qual, artisticamente, não caberia as tradicionais fotos de viagem. O não-lugar do corpo negro se parecia mais com a vitrine de um açougue do que com os luxos de castelos e jardins. Por muitas vezes, o reflexo da fotógrafa aparece nos vidros e se mistura às carnes registradas pelas suas lentes em um jogo com a posturas das selfies típica de turistas.
Paula Duarte é natural de Juiz de Fora, sua produção artística é marcada pelas linguagens híbridas, fotografia contemporânea e a pesquisa de poéticas negras. Desde 2012, participou de 14 exposições coletivas e três individuais. Realizou a projeção mapeada “Brilho” em 2017 e a performance “Eu me levanto” em 2018. Integra o Coletivo Descolônia, é graduada Comunicação Social e em Artes e Design, ambos na UFJF. Realizou mobilidade acadêmica na Faculdade de Belas Artes do Porto.
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