Augusto era o tipo de garoto que toda mulher gostaria de ter. Tipo atlético, pele negra brilhante, expressões bem alinhadas, como numa escultura de Michelangelo. Por onde passava, as mulheres suspiravam, apesar da ainda pouca idade.
Havia sido reprovado duas vezes na escola. Isso lhe amargava a triste convivência com seu irmão do meio na mesma sala – não porque não gostasse do garoto, mas porque sua presença o lembrava sempre de seu fracasso escolar, esse menino, que era uma criança ainda, tamanha era já a vivência do filho mais velho de Noêmia. E o irritava ainda mais o fato de aquele garoto ser meio bilolado das ideias; parecia não ter a idade que tinha, sempre carinhoso com a mãe, sempre querendo mais do pai. Não era possível, um irmão desmiolado.
Augusto era o tipo de garoto que inspirava atenções. Na escola, nem tanto, pois sabia se comportar bem no local de trabalho do pai. Além do mais, era um rapaz deslocado por lá. Achava todos os seus colegas metidos à besta, filhinhos de papai. No entanto, em seu bairro, era ele o mandachuva. Já novo, aprendera a lidar com sua sexualidade e o prazer que seu corpo lhe proporcionava. Aos 12 anos, com um amigo mais velho, num lote vago, descobriu que sua mão poderia realizar feitos enormes diante de seu sexo. A própria saliva de seu corpo fazia sua mão deslizar por seu pênis, proporcionando-lhe prazeres enormes. A partir daquele instante, não parou mais de se saciar diante de uma réstia de tesão que tivesse. Não havia um buraco que ele não preenchesse. Seja ele qual fosse.
Garoto extremamente rebelde, só quem o segurava era sua mãe. E, mesmo assim, por pouco tempo. Adorava jogar bola, era o rei das peladas. Na mesma intensidade, era o senhor das brigas de rua; e não levava nunca desaforo pra casa. Em certa ocasião, bateu tanto num rapaz mais velho que, dias depois, ele teve que fazer novo retrato do rosto. Ricardo, na ocasião, desdobrara-se para evitar um tumulto maior entre as famílias, pagando, em horas extras no trabalho, todo o tratamento do rapaz.
Faltando um ano pra atingir a maioridade, Augusto não via a hora de acontecer, apesar de já ter uma carteira falsificada, identificando-o como um garoto de 19 anos. Não havia lugar na cidade em que ele não entrava.
Não possuía grupos, não tinha amigos íntimos; era múltiplo, diversificado, convivia bem com todos, apesar do temperamento explosivo. Uma coisa ele não deixava barato: se mexesse com seus irmãos, quem quer que seja, iria pagar caro pelo que fizesse. Era super protetor deles, sentia-se na obrigação de ser, por ser o primogênito.
Apesar dessa relação com os irmãos, não tinha muita paciência com seus pais. Achava os dois uns coroas babacas – principalmente seu pai, que não tinha o tato de Noêmia, sua mãe; falava as coisas para o filho mais velho de maneira direta, objetiva. E, naquela noite, em que vira seu pai voltar a beber depois de tantos anos, percebera o quanto realmente estava distante do seu velho. Ao mesmo tempo, sentia o quanto ele era fraco, não se importando de saber sequer o porquê de Ricardo estar assim.
Aquilo era apenas o começo, mal sabendo o quanto puxara de seu pai tantos defeitos, deixando as qualidades estacionadas em algum canto da consciência.
Darlan Lula é doutor em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense. Escritor, autor de cinco livros, entre prosa e poesia. www.darlanlula.com.br
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