Em evento paralelo à Assembleia Geral (UNGA), oficiais da ONU se reuniram para discutir a urgência da defesa das mulheres e meninas contra violência de gênero em contextos humanitários incertos.
Seja conflitos, mudanças climáticas, deslocamento forçado, fome e insegurança, ou a pandemia, todos esses fatores aumentam as vulnerabilidades de meninas e mulheres. Neste sentido, surge um apelo por ação.
Foi o que destacou a diretora executiva do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Natalia Kanem, ao revelar a questão de violência baseada no gênero como uma das prioridades da agência, que destinará 43% do financiamento humanitário à organizações nacionais e locais de mulheres.
A notícia foi bem recebida, visto que, embora mulheres sejam geralmente as primeiras a sofrerem e agirem contra atrocidades em momentos de crise, muitas vezes o papel crítico e essencial das organizações femininas locais é negligenciado.
Os representantes de outras agências da ONU também presentes na reunião, destacaram as múltiplas barreiras enfrentadas por mulheres e meninas inseridas em conjunturas de crise, desde o pouco investimento até a falta de divulgação de informações sobre serviços destinado a elas.
Altos funcionários da ONU se reuniram paralelamente à 76ª Assembleia Geral na quinta-feira (24), para lançar um forte apelo à ação para erradicar a violência baseada no gênero (VBG), em meio a um aumento no deslocamento forçado e outras emergências humanitárias em todo o mundo.
A violência de gênero inclui atos que infligem danos físicos, sexuais ou mentais – ou outras formas de sofrimento, coerção e limites às liberdades pessoais – e tem “consequências de longo prazo na saúde sexual, física e psicológica das pessoas sobreviventes”, de acordo com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA).
Esses casos estão sendo impulsionados cada vez mais por conflitos, mudanças climáticas, fome e insegurança, aumentando as vulnerabilidades de meninas e mulheres.
‘Vontade de agir’ – A diretora executiva do UNFPA, Natalia Kanem, disse na reunião intitulada ‘Localizando a VBG em crises humanitárias’, que paz, justiça e dignidade são “direitos inerentes de cada mulher e menina”.
Kanem descreveu o projeto do Fundo para 2021-2025 como “claro e ambicioso”, que reflete uma visão compartilhada e ressalta a necessidade de criar novos caminhos para garantir esses direitos.
A diretora do Fundo, também enfatizou a necessidade de responsabilidade “perante nós mesmos e uns com os outros”, e reforçou seu mandato à frente da agência líder da ONU sobre o assunto. “O UNFPA está comprometido em permanecer forte”, afirmou.
Ressaltando a vontade da agência em atuar no tema, ela destacou também a importância de colocar as vozes das mulheres “no centro” das atividades.
“Agora mais do que nunca, elas precisam de nós”, insistiu Kanem, que dedicará 43% do financiamento humanitário do UNFPA a organizações de mulheres nacionais e locais.
Lembre do Afeganistão – O coordenador do Escritório das Nações Unidas de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU (OCHA), Martin Griffiths, chamou atenção para a situação preocupante de mulheres e meninas em conjunturas incertas ao destacar que o Afeganistão é “um importante lembrete da vulnerabilidade primária de mulheres e meninas em crises”.
O especialista do OCHA reforçou o papel vital das comunidades locais lideradas por mulheres, destacando que elas atuam como as primeiras a responder à crise.
Mencionando uma recente viagem à Etiópia, onde ouviu relatos em primeira mão sobre os traumas sofridos por mulheres na região em conflito de Tigray, Griffiths relatou que foram as comunidades locais as que primeiro responderam às atrocidades. Para ele, isto ressalta a “importância absoluta” de ouvir e proteger mulheres e meninas, e também de “proteger as comunidades locais para que façam o que naturalmente desejam”.
No entanto, lamentou o chefe da ação humanitária da ONU, a proteção das mulheres é uma das partes menos financiadas do programa humanitário.
Divulgando informações – A diretora executiva do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Henrietta Fore, alertou que, para cumprir “a ambiciosa chamada à ação”, é importante divulgar para as meninas e mulheres em campo os serviços disponíveis. “Isso não fica nada claro”, lamentou a chefe do UNICEF.
Fore fez referência ao relatório do UNICEF “We Must Do Better”, que fornece uma avaliação feminista global das experiências de mulheres e meninas, e das organizações lideradas por elas, durante a pandemia COVID-19. O relatório destaca que as necessidades das mulheres e meninas são ignoradas ou tratadas como uma reflexão tardia; e que, apesar de estar na linha de frente das crises humanitárias, as mulheres não são levadas suficientemente a sério.
Embora a demanda por serviços de violência baseada no gênero tenha aumentado durante a pandemia, os recursos não aumentaram, lamentou mais uma vez a diretora do UNICEF pedindo maior apoio, inclusive financeiro, para grupos locais de mulheres.
Burocracias que dificultam – Combater a VBG também é uma prioridade importante para a Agência de Refugiados da ONU (ACNUR), de acordo com o alto-comissário da agência, Filippo Grandi. Ele destacou que em situações de deslocamentos forçados há uma janela de oportunidade para que essas violações ocorram.
Grandi reconheceu que durante crises humanitárias, como todos estão se movendo rapidamente, muitas vezes o papel crítico das organizações femininas locais é negligenciado.
A principal autoridade do ACNUR afirmou que fornecer recursos “substantivos, flexíveis, diretos e rápidos” para organizações lideradas por mulheres e sediadas em comunidades sem burocracia indevida é “uma das formas mais importantes” de empoderá-las. Ele, no entanto, admitiu que “este é um apelo difícil”, já que o financiamento humanitário segue a tendência de ser burocratizado.
Clique aqui para assistir a reunião na íntegra (em inglês).
Matéria originalmente publicada em Nações Unidas Brasil em 24/09/2021 – Atualizado em 24/09/2021.
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