– Nos encontramos, andamos até achar alguma rua sem saída e sem movimento, conversamos e achei ela bem legal. Aí, por fim, nos beijamos.
Foi o que contei a Ana no dia seguinte.
E era o que tinha acontecido.
Mais ou menos.
A menina do terceiro encontro era mais experiente do que eu, e mais desinibida.
Conversamos bem pouco, ficamos bem mais.
Conseguimos encontrar uma rua sem movimento algum, sem nada que desse vista para nós e, por lá, passamos as horas que se referiam ao horário de aula – após isso, era ir para casa como se estivéssemos na escola – nos agarrando.
Ela era mais intensa, fisicamente falando. Repleta de mãos que sabiam onde queriam ir e onde percorrer e, eu, apenas uma cópia de movimentos. Mas foi nessa situação que parei para analisar a vontade sexual de estar com uma mulher que também, como tudo em mim, se fez urgente.
As “cócegas” de vontade que surgiram a partir desse contato me instigaram a levar adiante outro encontro com ela, marcado para o outro dia, para, enfim, ter a minha primeira vez (ou seria segunda?).
Tudo na vida é necessário experimentar para descobrir se você vai gostar ou não. Eu gostara dos beijos; faltava, então, o sexo. Porque minha conclusão definitiva de que eu realmente gostava de homens foi a partir do meu contato tal com um. E, por que não descobrir também da mesma forma com uma garota?
Não falei sobre esses detalhes que havia pensado com Ana. Parecia ousado demais.
E eu já tinha em mim a sensação de que estava deixando às claras os meus sentimentos através de gestos bobos e simples que, talvez, ela estivesse percebendo – mesmo sendo apenas medo irracional.
Então, se falasse sobre, ela poderia entender que também gostaria de que essa primeira vez fosse novamente com ela – o que eu não descartaria como plausível.
Quando, no dia do segundo encontro, saí para encontrar aquela garota, eu estava completamente ansiosa, nervosa e com um misto de sensações.
O que aconteceria? Como aconteceria?
Ela me levou para a casa de um amigo, que havia cedido simpaticamente sua residência enquanto ele estaria fora.
Era real e ia acontecer.
Na minha primeira vez com um rapaz, eu estava apreensiva e sem saber o que fazer. Entender a anatomia humana através de livros e filmes se tornava diferente na prática. Eu era inexperiente, e deixei claro para ele, que soube me conduzir a tornar nosso momento agradável.
Eu estava, obviamente apreensiva com a garota também; mas, por dentro, havia uma consciência de saber que o mesmo corpo nu que eu tinha seria o mesmo corpo nu que ela tinha.
Ela sabia que seria a minha primeira vez. Sabia que eu não teria ideia do que fazer – apesar de que havia essa estranha lógica me conduzindo a tomar frente perante as circunstâncias e não ser totalmente leiga perante a masturbação. Mas, ainda assim, não fiquei totalmente confortável.
Claro, foi uma ocasião única e nova, inesquecível; contudo, não tinha gostado o tanto que achei que gostaria. Não do sexo – porque eu tive certeza de que, realmente, eu desejava garotas -, mas de estar com essa menina. Algo nela e na ocasião fez com que fosse impossível eu me transportar totalmente para o nosso momento.
Foi bom, mas não foi.
Foi gostoso, mas não foi.
Foi repleto de mãos e dedos e línguas e gozo.
Mas não tínhamos química.
Ficou no ar a sensação de que eu provavelmente tinha desejado demais e esperado o que não deveria esperar.
Mas foi a primeira vez, primeira experiência.
E eu queria mais.
Mas, em primeiro lugar, eu queria a Ana.
– Você já aprendeu, logo de cara, que a vida não é como a gente espera. – Passei a ir para o colégio com Mauricio também, assim tínhamos mais tempo para conversar. – E nem sempre vai ser do jeito que a gente quer que seja.
– Pois é, mas eu acho que talvez eu tenha idealizado demais. – eu tinha acabado de contar para ele todo o ocorrido.
– Acho que você disse o certo. A gente idealiza demais, e quando acontece totalmente fora daquilo que pensou, a gente não gosta.
– Mas eu gostei, só esperava…
– Mais? – Riu. – Você esperava bem mais por causa dessa idealização. E te digo: você idealizou essa primeira vez com a Ana, por isso ficou decepcionada.
– Você acha? – Eu tinha certeza.
– Claro! Você beijou a Ana, se apaixonou por ela, e queria que ela também fosse o primeiro sexo. Não aconteceu desse jeito, a expectativa já era.
– Verdade. Mas acho que nunca vai ser do jeito que eu idealizei.
– Nunca diga nunca. – Ele concluiu. – Tudo pode acontecer nessa vida louca.
Mauricio tinha me aconselhado a contar para Ana, sem o detalhe de que eu não tinha cumprido com a expectativa do meu sonho. Assim, narrando os fatos sem muitos detalhes, eu poderia ver como ela reagiria e se, nessas expressões que talvez fossem feitas por ela, teria como saber se haveria algum lampejo de possibilidade de a gente acontecer – ideias adolescentes.
Se existia, ela não deixou transparecer. Tratou tudo como sempre, na maior naturalidade e sem exibir algo que fizesse eu ter motivos de julgar alguma probabilidade futura.
Ela ficou feliz por eu ter dividido com ela toda a história e, após eu me ouvir falando em voz alta, resolvi dar um tempo. Achava melhor voltar a deixar a vida trazer as coisas para os momentos propícios do que forçá-las a acontecer. Resolvi assimilar tudo o que estava acontecendo a descoberta sexual com um homem, o desejo do mesmo sexo, o primeiro beijo, a descoberta sexual com uma mulher e a paixão por Ana.
Era muita coisa acontecendo dentro de mim e eu ainda não sabia digerir – e ainda insistia em ter tudo ao mesmo tempo sem pausa para respirar. A única certeza que tinha era que, se alguém perguntasse, com todas as letras eu diria que não era mais cem por cento hétero – e ainda bem.
Barbara Pippa é nascida em Juiz de Fora, participante em antologias de poemas e contos. Acredita em astrologia e muda o cabelo de acordo com o humor.
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