Quando ele girou a chave na fechadura da porta, ela já estava na cama, de bruços, com lingerie provocante e cinta-liga, transformando aquele espaço em um depósito de especiaria rara. Sem deixar ao menos que ele atravessasse a cozinha do flat alugado pra ela, Alciléia já perguntava: “Quem é o meu cachorrão?”
Então ele parava, erguia o queixo para o alto e soltava um uivado estrondoso e grave, ecoando sua posse pelos cantos do apartamento. Ela estava especialmente radiante àquele dia: os cabelos volumosos na altura dos seios, loiros como os raios do Sol que serpenteavam na janela do quarto do lado de fora; as sobrancelhas firmes, bem delineadas e grossas, demonstrando personalidade de femme fatale; seios à proporção do corpo, auréolas rosadas e intumescidas por dentro do sutiã vermelho sangue meia-taça rendado e transparente; cintura como que esculpida por Rodin nas suas inspirações mais divinas; coxas torneadas e femininas; suaves pelos percorrendo suas carnes, como se cristais cobrissem seu corpo nas regiões mais provocantes e desejadas; e uma calcinha discreta deixava entrever seus glúteos num horizonte infinito de possibilidades.
– Nossa! Como você está linda.
– Vem cá, meu cachorrão. Estava morrendo de saudades.
Ele se debruçou sobre ela e começou a beijar o seu corpo, a começar pelos pés. Alciléia fechou os olhos de desejo e mordeu o canto inferior direito do lábio. Rubens sabia conquistar uma mulher, principalmente quando a enchia de mimos. Aquela, ele queria só para si – pelo menos, era o que pensava quando resolveu tirá-la da vida e alojá-la num flat localizado no centro da cidade. Iriam completar um ano naquela vida clandestina e cheia de luxúria.
Não era o tipo de cara que chamava atenção. Já com seus cabelos grisalhos, pose de galã, mas pinta de meia idade, ele se esforçava para evitar ainda o resquício de um abdômen saliente que insistia em não abandoná-lo. No entanto, na cama, compensava com seu jeito atrevido de ser e suas inúmeras fantasias que espalhava pelo corpo e pela mente de sua ninfeta insaciável.
– Que delícia, amor. Hoje você se superou. Me deixou louquinha.
Ela se jogou sobre o corpo nu do seu homem e lhe deu um beijo demorado. O quarto era um misto de suor e perfume, de líquidos cúmplices que escorreriam pelo lençol, misturando-se aos corpos jogados e cansados sobre o ponteiro daquela tarde de fevereiro.
– Minha linda – ele pousou a cabeça em seu peito –, você se lembra daquele papo que nós tivemos mês passado? Aquele sobre apimentarmos um pouco a relação?
– Sim… lembro, sim. O que foi? Achou quem procurava? – Ela ergueu a cabeça num sorriso discreto e lascivo.
Ele a puxou para si e disse sussurrando em seu ouvido: “Você vai achar o garoto uma delícia…”.
– Quantos anos, Cachorrão?
– 19 aninhos.
Ela se animou, ajoelhou-se na cama batendo palmas com as pontas dos dedos.
– E quando vamos brincar com ele?
– Calma, minha cadelinha. Você estava reclamando que não ia à festa alguma, que eu sempre a deixo trancada aqui! Agora surge uma oportunidade. Vocês dois irão juntos na festa de Carnaval do Clube, no sábado.
– Ai, que delícia. E como ele é, hein?
– Você verá. Garanto que irá gostar. Mas antes tem que ser uma boa e comportada menina.
Disparou um tapa na bunda de sua amante e passaram a tarde entre afagos e devassidões.
Darlan Lula é doutor em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense. Escritor, autor de cinco livros, entre prosa e poesia. www.darlanlula.com.br
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