CAIR UM TUDO ela entornou tudo de mágica de mágica no entorno dela era uma coisa tudo tudo aquilo era ela a raiz de tudo era fruto cada abacate cada um caía constante ameaça sobretudo sobre tudo o que havia ela controlava tudo com sua magia de atos sem palavras nem gingas ela sentar naquele banco sob o abacateiro cheio de frutos era inverter o tempo dos galhos as folhas subiam por ventos retendo flutuantes os frutos então eu podia deitar sob aquele abacateiro cuidadoso de ter minha cabeça sobre aquele colo protegido de um tudo olhos nas nuvens sobretudo através dos galhos reparava cada fruto cada um na sua parte das raízes fincadas no céu do sol até as pontas dos dedos dela que vinham e iam entre os fios dos cabelos agora mágicos na minha cabeça pude então deixar os músculos se soltarem um a um fechar os olhos abrir os poros no balanço parado sustenido no tempo verde terra azul ouro nessa roça mágica minha avó criou o mundo um terreiro um quintal um universo de mim e dela varia das versões de tudo hoje procuro esse lugar suspendido na iminência de que os abacates cairiam tudo
Oi, você que me lê. Trago mais um poema para essa série de contribuições mensais à Trama. A ideia é colocar, para rodar no mundo, algumas imagens muito íntimas minhas, que também (vai que…) podem ser íntimas suas, mesmo que com outras cores e ruídos diferentes. Às vezes, a coisa vem num poema ou num ensaio curto sobre algum trabalho artístico que me arrebate. Este poema, CAIR UM TUDO, já estava escrito faz tempo, num caderninho meu da infância; o que fiz foi trocar algumas palavras e rearranjas as quebras, além de enfiar mais uns versos aqui e ali, coisas que já são da vida de quem paga boletos e se pega muitas vezes preocupado com tudo, beirando um nada, e sente muita falta de fazer nada podendo ver tudo. A imagem que associei ao poema foi sugerida pelo amigo Paulo Stuart, figurando sua mãozinha. O recorte é da foto feita pelo Victor Adams Mantelli, fotógrafo, videomaker e cientista social [confiram o trampo dele: @olhovixx ]. Assim, vou seguir com essa ‘curadoria’ curandeira de afetações.
Tálisson Melo é Artista-pesquisador. Doutorando em Sociologia e Antropologia na UFRJ. Publicou o livro “Mesmo Sol Outro” com Carolina Cerqueira (2018). Atualmente trabalha em projetos curatoriais-editoriais e de pesquisa em Montevidéu, Juiz de Fora e Nova York – emaranhando artes visuais, poesia, design, arquitetura, cinema, história e ciências sociais. @talisson.melo @mesmosoloutro