O brasileiro é um tipo angustiado. Sempre foi. A propaganda do brasileiro feliz te enganou, enganou a mim, enganou a todo o resto do planeta. Nós não somos, nunca fomos e nos próximos anos não seremos o povo alegre que estampa as páginas que tentam vender nosso carnaval como festa da felicidade. [aquilo é um lapso permitido para que não enlouqueçamos em evangelhos proferidos pelos arautos do fim do mundo.]
O negro, que nunca deixou de ser escravizado, tem sua história atravessada pela violência de todos os seus estratos de vida. Sufocado e pisoteado em horas de trabalho e descanso, seu direito é ter a condescendência de ainda estar vivo – até que esse alguém decida que não. E como não choca negros mortos por banalidades, para esses alguéns sempre é possível que exista algum excludente. Afinal, melhor morto que triste. [pessoas tristes não produzem tanto.]
O indígena, que nunca deixou de ser o que era para ser. [selvagem?] Se o índio não quer explorar, porque ele quer celular? A tristeza com maior tempo dentro de nossa recente narrativa com nome de Brasil. E corajosa em resistir.
A mulher, que nunca deixou de ser ferida, morta, estuprada, humilhada. Continua sofrendo. Os abusos que as entristecem são cotidianos e de tamanhos variados. [a tristeza aqui é sempre culpa dos homens, embora o peso da angústia recaia sobre a mente e o corpo feminino.]
O branco, que nunca deixou de ser o estrago, também sofre com o machismo e o racismo que se entranham pelos seus poros e angustiam os que tentam entender o que vivem. Os canalhas vivem suas vidas sem angústia, mas com muito ódio. Qual veneno é pior? Qual mata mais rápido?
O amor então é taxado, categorizado e enclausurado em formas familiares que nunca trouxeram felicidade a todos os seres, nem nunca trarão. E se você não se adequar ao binarismo e ao conceito de pai, mãe e filhos pode – então – se adequar ao slogan ame-o ou deixe-o e se retirar do convívio dos iguais. Longe de mim ser homofóbico, mas não precisa beijar em praça pública. [para viver aqui o amor não vale se não cumprir o desejo fálico de um homem, hétero, branco e cristão – a representação da angústia pode ser essa figura.]
A alma brutalizada em uma espiral de culpa religiosa, ansiedade e modorra do seu próprio tempo tenta se enganar com felicidades momentâneas e lapsos salvadores em meio ao caos – futebol, música, carnaval, drogas. Nada cresce em solos mal iluminados. Nada cresce em ambientes de culpa e medo.
A democracia aqui inexiste, parte de uma farsa para manter a maior desigualdade do mundo ativa. Cruel é a forma de enganar a quem crê que participa da escolha de sua vida. [as escolhas não podem ser feitas pelos pobres, só querem igualdade, não pensam no crescimento da nação.] Fascismo disfarçado de patriotismo é a melhor maneira de manter nossos privilégios. [foda-se a tristeza de quem não tem como pagar.]
Pelo menos é isso que eles querem. [entorpecer a alma, o corpo e a mente é preciso. eles detestam alegria. ainda mais alegria coletiva.]
Mas é importante saber que estamos por nossa conta.
Pedro Carcereri é escritor, diretor, produtor e curador. Bacharel em Artes e Design e mestre em Artes, Cultura e Linguagens pela UFJF. Autor dos curtas “Modorra”, “Maria Cachoeira” e do romance “Sob o Trópico de Capricórnio”. Curador e crítico de arte, desenvolve exposições e pesquisas em diversas interfaces da arte contemporânea. Faz parte da seleção do Sesc Confluências – MG e é conselheiro de cultura de Juiz de Fora.
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