16. Siga o raciocínio

Quando já havia imobilizado o gatuno, pegou a faca de açougue número 15, amolada há algumas horas, cabo branco, e foi penetrando levemente no corpo do rapaz, já ensanguentado pelas porradas que levou. Aquela perfurante lâmina começou a penetrar levemente na carne do infeliz, e ia diminuindo e cortando parte do esterno do garoto! Ele agonizava e começava a cuspir sangue em golfadas.

Virou-se para o filho e disse: “Está vendo, filho, como resolvemos as coisas por aqui? Está vendo? Aprenda!!! Porque a vida é assim, não perdoa. E você tem que ser maior que ela. Assuma o cabo”. Deu a faca com o cabo branco, já vermelho do sangue do rapaz, e continuou sua explanação: “Vê esse cabo branco? Tornou-se vermelho na medida em que esse filho da puta quis entrar no nosso quintal e roubar as nossas coisas!!!!! É assim a vida! Eu construí esse muro alto aqui neste bairro justamente porque eu não quero nenhum enxerido pulando a porra do meu muro!!!!!”

E o pai falava isso pro seu filho em tom baixo, voz cadenciada, como um pai ensina ao filho a oração do dia a dia. Falava baixo porque principalmente detestava fazer barulhos que incomodavam o vizinho. Por isso era limpo, preciso, cirúrgico.

O filho olhava para o pai extasiado e estático, como se recebesse os ensinamentos de um colega de escola. Ele gostava daquilo tudo. Até porque cresceu com o temperamento paterno. E criar aquele momento com o pai foi a melhor conquista dele desde criança. Agora, com 13 anos, podia perceber que não se muda a vida. Você a muda. Como quando ele faz com que aquele rapaz pule o muro, feito uma isca, só para ver o seu pai em ação, como um bicho solto na savana, sol a pino, cruzando todos os caminhos que te levam ao precipício. Mas qual? O das nossas próprias almas interiores.

E a vida se forja em pai… filho… e espírito santo!


Darlan Lula é doutor em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense. Escritor, autor de cinco livros, entre prosa e poesia. www.darlanlula.com.br



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