Estamos Líquidos

De acordo com Zygmunt Bauman (1925-2012), um dos Sociólogos mais respeitados e produtivos das últimas décadas, vivemos em uma sociedade líquida onde nada é feito para durar.
  “Diferente do ‘sólido’ o líquido não tem forma constante, ele muda rapidamente, e isso, sob a menor pressão” disse Bauman. E essa inconstância como característica do comportamento da nossa sociedade resultaria em uma série de problemas, e de acordo com ele, uma dessas  principais crises seria a instabilidade dos relacionamentos sociais e amorosos.

  Quando parei pra pensar a respeito disso, me lembrei de uma dia em que eu estava na casa na casa da minha avó paterna, e admirava alguns pratos de coleção que ela tem pregados na parede formando um mural. Eu os pedi para o dia que eu tiver minha própria casa (acho lindíssimo!). Ela riu, e logo disse que ninguém quer coisa dos avós mais, ninguém se importa com as coisas antigas pra levar adiante, tudo é velho, ultrapassado. De acordo com ela, ninguém mais guarda nada para ser passado às próximas gerações. E assim ela começou a me mostrar a quantidade de coisas antigas (e bem cuidadas) que tinha em casa, e que nunca precisaram de serem descartadas, e que com o tempo adquiriram valores sentimentais insubstituíveis.     

  Pela leitura de Bauman, sabemos sim que vivemos em uma era em que a vida real se entrelaça ao mundo digital, e de fato não são somente os objetos que se tornaram facilmente descartáveis. Mas, a questão que precisa nos nortear é: o que fazemos/faremos pra evitar que continuemos superficiais perante aos fatos do caos que isso tudo tem causado e continuará causando em nós, em nossa saúde física, mental e espiritual? Em nossos relacionamentos, em nossas escolhas, e nas futuras gerações?

  Em nossa realidade vemos pessoas sendo usadas como pontes para chegar às satisfações egoístas, e rapidamente/facilmente descartadas, sem o interesse de vivenciar o tempo, a fim de “solidificá-las” em relacionamentos estáveis. Cada vez menos os relacionamentos atuais carregam caráter duradouro. Não só os amorosos, mas as amizades e as relações profissionais também.

  As pessoas não se sentem livres por serem quem são, precisam se encaixar nesse fluxo.
Percebo então, o quão iludida nossa geração tem ficado pelo padrão de renovação. Temos nos “moldado” assim como o líquido, àquilo que nos tem sido apresentado diariamente.
Se não deu certo de primeira, desisto. Se não gostei, te “cortarei” facilmente da minha “lista de amigos”. Consegui o que eu queria nessa noite, amanhã não importa quem você é, “a fila anda”. Estamos constantemente renovando e descartando coisas e pessoas em um ciclo acelerado.

  Observando a atitude da minha vó pude perceber que são poucos os que mantêm valores saudáveis da vida e ainda conseguem viver no equilíbrio. E aí, pensei no seguinte provérbio inglês: você ganha algo, você perde alguma coisa.
Daí me pergunto: qual é a qualidade daquilo que estamos perdendo (trocando,substituindo, descartando), e qual é seu valor se comparado àquilo que estamos ganhando? 


Lara Souza Freitas é Pedagoga e missionária. Estava em missão na Inglaterra até Jul/20. É autora de dois livros.


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