Falhamos como sociedade. Falhamos como modelo civilizatório. Falhamos.
Perdemos todos. Eu e você, que me lê. Perdemos amores, parentes, amigues, pessoas queridas, perdemos conhecidos de conhecidos, desconhecidos. Perdemos.
Perdemos até o que não sabíamos que tínhamos e que se escondia em alguma dita normalidade: perdemos, no meio de tanta perda, algum sentir.
Não sei se nossa fisiologia ajuda, se a mente dá um jeito, mas nos acostumamos. Nos acostumamos o suficiente para sair para passear no meio de 100 mil corpos. Perceba, não é um texto que culpabiliza quem está saindo para passear, depois de 5 meses de incertezas e medo. É um texto só que aponta onde chegamos.
100 mil vidas. Perdemos. Mas a vida tem que seguir. Fico lidando também com as minhas urgências e vontades. Compro pela internet, escrevo, publico, vejo lives, cuido, a vida vai acontecendo e tem suas demandas.
Mas em algum momento, há de vir o luto. Eu não sei se já veio, se vai vir mais forte quando finalmente andar na rua e perceber as ausências e lugares de afeto que não existem mais.
Não sei. Não sei de muita coisa. Depois de 5 meses de incertezas e medo, não sei de muita coisa. Só sei que seguimos a vida. Nem todos de nós falamos sobre as 100 mil vidas perdidas entre gargalhadas. Que bom.
Quem ri, quem manda seguir porque quem tem que morrer morre mesmo, e daí?
Quem faz isso não perdeu nada, nunca teve.
Lorraine Mendes é professora substituta da EBA-UFRJ, Doutoranda em Artes, Cultura e Linguagens pelo IAD-UFJF, artista e tatuadora.
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