POESIA, PRA QUE TE QUERO

A palavra “poesia”, sozinha, é capaz de gerar calafrios em muita gente, e gente dos mais diversos tipos. Independentemente de idade ou classe social, o conceito popular de poesia é de um texto pretensioso: rimado; carregado de palavras difíceis; e de cunho sentimentaloide. Mesmo quem não detesta, muitas vezes, tem dificuldade de apreciar – e quem não conhece, só a partir dessa ideia, já desiste de conhecer.

A palavra “poesia” também é muito associada a uma noção de transcendência, de inspiração; escrever algo poético, para muitas, só pode ser fruto de experiências extracorpóreas. Mal sabem elas… (risos)

Associações são associações por uma razão. Não é mentira que existem, sim, poemas sentimentaloides, de linguagem pretensiosa e cuja qualidade é prejudicada pelo apego à forma. Também não é mentira que muitos poetas ainda batem na tecla da inspiração para justificarem suas obras. Mas ainda que esses elementos, em muitos casos, sejam parte da concepção de poesia, penso que não fazem parte do processo da maioria dos poetas e, assim, entendo que são dispensáveis, todos eles.

Como qualquer tipo de arte, a poesia é um estilo de vida, muito mais do que as técnicas e as temáticas; é uma forma de olhar para o mundo, da qual mesmo o pior rimador é capaz de desfrutar. Que motiva a pessoa que olha a adquirir técnicas para expressar o que viu.

Penso a poesia enquanto a luta entre harmonia e caos que está nos olhos de quem vê – e, portanto, pode estar qualquer lugar, surgir de qualquer momento, se originar em qualquer pessoa, dizer de qualquer tema.

Como qualquer tipo de arte, porém, a poesia também demanda trabalho. Enquanto criação, a linguagem oral e escrita surgiu para servir à humanidade; porém, não raro, faz sua senhora de refém. A arte da poesia está, porém, justamente na manipulação: o indivíduo contra a palavra. Já dizia Drummond:

Palavra, palavra
(digo exasperado),
se me desafias,
aceito o combate.

Dos poetas mais famosos aos mais desconhecidos; das quadrinhas mais simples aos poemas mais elaborados; o trabalho está presente. Se a palavra nos é comum a todos, por sua vez, a tradução da visão em poesia é exercício, é erro, é experimentação; é busca de intimidade com essa palavra, tão cotidiana, tão acessível, que se opõe em valor capitalístico à matéria prima de tantas outras artes, mas que consegue ser tão ou mais desafiadora do que qualquer tinta sobre tela. Eis o peso artístico da poesia, levado pelo poeta como o mundo sobre os ombros de Atlas, lido pela sociedade como pluma que toca o solo.

Essa semana, dedicamos a Trama à poesia, feita para apresentar novos mundos a olhares disponíveis. E que o peso do mundo sobre as costas dos poetas possa ser compartilhado com aqueles que se tocam por suas palavras.


Carol Cadinelli é jornalista, apaixonada por palavras. Escreve, edita, revisa, traduz e, vez ou outra, fotografa. Atualmente, é editora na Trama.


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