Areias do Tempo

Empilhados ao meu lado e por todo o chão, hora de forma ordenada traçando belos desenhos e hora de maneira caótica e descontrolada, estão os menores livros jamais escritos. As pilhas de livros formam-se umas sobre as outras, e assumem as mais diversas configurações. Hora formam longos planos capazes de sustentar muitas pessoas sem envergar; hora formam grandes pilastras, que unem-se umas às outras formando paredes altas que bloqueiam o sol e o vento. Hora formam longas planícies sobre as quais pode-se andar por horas e horas; hora formam altas pirâmides, com paredes íngremes e difíceis de escalar. As formas intercalam-se entre si, criando belas paisagens que se estendem até onde a vista pode alcançar. 

Complexidade maior é observada nos próprios livros, que assumem as mais variadas aparências. Uns são grandes, e outros nem tanto. Uns são coloridos, com padrões complexos cobrindo cada espaço em suas superfícies; outros têm uma só cor, destacando-se por sua monotonia. Uns são ásperos como lixas, e outros tão lisos quanto vidro, por vezes polidos até se confundirem com pequenos diamantes. Uns são leves, quase levados embora pela mais leve das brisas; outros pesados a ponto de nunca saírem do chão. Uns são resistentes, quase inquebráveis, e outros esfarelam-se ao mais leve dos toques.

Por mais diferentes que sejam uns dos outros, os livros contam uma mesma história. Ou, mais precisamente, partes dela. São volumes de uma série longa, escritos de forma displicente e publicados às pressas, quase sem nenhum rigor ou controle. Não há ordenação de qualquer tipo, ficando a encargo do leitor decifrar o encadeamento apropriado dos exemplares. Muitos dos volumes se sobrepõem quase inteiramente, idênticos à exceção de uns poucos detalhes. Ao mesmo tempo, segmentos inteiros da história são omitidos esporadicamente, deixando enormes lacunas no enredo. Há ainda casos onde novos trechos da história são escritos sobre os antigos, às vezes mais de uma vez, chegando ao absurdo de um só volume conter quatro, cinco ou mesmo seis trechos completamente distintos escritos uns sobre os outros.

Talvez o mais trágico seja a certeza de que a história retratada nos livros nunca será lida, ao menos na íntegra. Ler esta história inteira, sem omissões, seria o mesmo que contar de 0 a 1 sem pular nenhum número, e não levaria menos que uma eternidade — possivelmente mais. Ademais, são poucos os leitores capazes de compreender a linguagem arcaica e quase esquecida usada nesses livros, relegando a imensa maioria dos exemplares. Por conta disso, os livros são deixados ao relento, lentamente apagados pelas intempéries, e aos poucos soterrados pelos novos volumes trazidos pelo vento e pelo mar.

 


Hely Branco divide seu tempo entre escrita e ciência. Geólogo e Astrônomo, é doutorando em ciências planetárias, desenvolvendo pesquisas sobre crateras de impacto em Marte. É militante comunista e ambientalista, defendendo a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, na qual a proteção do meio ambiente e a garantia dos direitos humanos essenciais é prioridade. Quanto o tempo permite, dedica-se à literatura e a escreve um pouco de tudo, em especial ficção científica, terror e fantasia. 


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