Estávamos voltando para casa. 

Era a segunda vez que Isadora me acompanhava no trabalho. 

Ela me seguia emburrada, testa franzida e olhos cerrados. 

Nos desentendemos na saída do trabalho. 

Chegamos no ponto de ônibus e ela rapidamente achou um canto em um banco. 

Lá permaneceu emburrada, mas sentada. 

Todos que passavam percebiam que alguma coisa havia acontecido. 

Uma senhora se sentou ao lado e a cumprimentou. 

Sem sucesso! 

Logo em seguida, outra senhora reconheceu a amiga no banco e puxou conversa. 

Conversa vai, conversa vem, perguntou: “essa moça bonita e emburrada é sua?” 

“Não!” disse a outra. 

“Realmente, dá pra ver que ela não tá bem.” 

De canto de olho eu observava. 

“Menina!”, disse a senhora mais velha, “não fique com  ara emburrada: dá ruga!!!” 

“Olha pra mim, 85 anos, quase não tenho rugas.” 

Realmente, aquela senhora de estatura baixa, pele negra bem retinta, possuía pouquíssimas rugas e, ao revelar a idade, deixou todos ao seu redor surpresos. 

“Sorria!!!”, continuou, “é o melhor remédio pra ruga, pros problemas e pra vida!” 

Isadora, então, esboçou um sorriso acanhado e, ainda, amarelado de chateação. 

“Olha!!! Como você fica ainda mais bonita!!!”, disse aquela senhora voltando a conversar com sua amiga. 

“Você tá trabalhando?”, perguntou. 

“Sim, e você?”, continuou a conversa a amiga. 

“Me mandaram embora, acredita?” 

“Ninguém quer saber de uma velha analfabeta”. 

Sorrindo, olhou pra Isadora e disse: “Estude e não fique velha!!!”. 

Intrigando a minha pequena. 

Eram dois “problemas”: a falta de estudo e a idade, como se houvesse prazo de validade. 

Um ônibus parou e aquela senhora se foi. 

“85 é muito tempo, né menina?” Disse a amiga que ficou. 

“Eu tenho um pouco mais da metade e você deve ter um décimo desse tempo…” 

“Mas, por que ela ainda trabalha?”, perguntou Isadora. 

“É uma família grande que ainda depende dela…. Necessidade, ela ainda precisa…” 

Se aquela senhora não era o arrimo, certamente reforçava o orçamento familiar com seu trabalho. 

Existem realidades que se mostram tão complexas e cruéis pra mim. 

Imagine ao olhar curioso, doce e, ao mesmo tempo, inocente.  

 


Iverson Silva é professor de História da Rede Pública, Historiador e Escritor. 


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