O multi-instrumentista e compositor juizforano Diogo Veiga descobriu um mundo inteiro de possibilidades musicais quando começou a pesquisar os instrumentos africanos há mais de cinco anos. A musicalidade afrocentrada, ou seja, aquela que se baseia na música ancestral feita há séculos na África, é a principal característica da sua produção autoral que foi apresentada para o público de Juiz de Fora com Egbe Tóbi Ode, seu primeiro EP autoral lançado na última sexta-feira, 24 de março.
As palavras Egbe Tóbi Ode estão escritas em iorubá e significam Comunidade dos grandes caçadores/caçadoras. Em um primeiro momento, o EP ia ser exclusivamente com músicas instrumentais, mas durante o processo de composição, veio a inspiração para uma letra. Esta música é a faixa Ijexá pra Oxum que foi lançada como single no início de março, abrindo os lançamentos do EP.
“Quando eu estou com esses instrumentos, eu fico mais preto.”
Diogo Veiga
A pesquisa de Diogo sobre a instrumentação africana teve duas grandes origens: quando começou a atuar como arteeducador e a sua iniciação no o candomblé. Naquele momento, a grande questão que o impulsionava era estar em contato com uma musicalidade que o representasse mais, que falasse de suas alegrias e dores, que tivesse a sua cor.
A Trama conversou com o Diogo pra saber um pouco mais sobre sua relação com a música, sua ancestralidade, sobre o lançamento do seu primeiro EP e sobre sua carreira como multiinstrumentista, que você confere agora!
Revista Trama: 1- Ei Diogo! É um prazer enorme conversar com você sobre o lançamento do seu primeiro EP! Conta pra gente um pouco da sua trajetória na música até a chegada desse momento.
Diogo: Poxa! Na música desde que eu me lembro, o meu despertar foi quando eu tinha 4 anos de idade. Meu tio Marçal me deu um tamborim, esse meu tio era mestre de bateria de escola de samba no Rio de Janeiro, então, ele me deu esse tamborim. Em determinado momento fizeram uma homenagem para ele, os artistas fizeram uma homenagem pra ele e nesse dia eu toquei. Acho que desde desse dia eu decidi – então é musica,né -. Depois eu encontrei a musica na capoeira ,e eu encontrei a musica na religiosidade.
A música sempre foi muito forte dentro de casa por conta desse meu tio, Marçal, por conta da minha mãe que tá na linhagem dele, então, sempre escutando samba em casa, sempre escutando MPB, sempre escutando esse tipo de musica em casa. Meu pai também, tocou tarol em uma escola de samba de Juiz de Fora. É isso, a música em casa é forte. Depois nesses momento em que eu fui entrando, aprofundando, e de alguns anos pra cá nessa questão da religiosidade. Isso vem trazendo bem forte essa questão de uma música mais afrocentrada, de uma musicalidade mais preta.
RT2 – Qual é a inspiração por trás do seu EP e como você escolheu as músicas que o compõem?
Diogo:: A inspiração primária do EP é “O Caçador”, o jovem e grande Caçador. Ele é a inspiração primária do EP. Porque o EP conta a história do Grande Caçador, Egbe Tobi Ode, comunidade dos grandes caçadores e caçadoras. E eu que eu vinha fazendo os estudos desses instrumentos, no EP e eu fui testando. Tive um tempo nessa caminhada desde que esses instrumentos chegaram, deve ter uns 5 anos, desde que eu comecei ter o primeiro contato com esses instrumentos, então eu comecei a testar, fazer testes, compor e eu vi que algumas ideias estavam legais. Aí eu soltava alguns takes no instagram, nos stories, uns vídeos, e aí a galera começou a comentar –pô que massa– , os mestres e as mestras falando – maneiro – , aí eu falei – pô então dá pra formar um EP – .
RT3 – Como foi o processo de criação e gravação deste EP? Houve algum desafio particular que você enfrentou?
Diogo: Eu lapidei mais forte esses estudos dentro do momento da pandemia,foi onde que eu pude acessar um computador, uma plaquinha de som, um homestudio, um estúdio dentro de casa mesmo e pude fazer as pré-produções desse disco. Pude começar a gravar as camadas de instrumentos tocando ao mesmo tempo, e eu gravando somente tocando um,né, dando a sensação de um arranjo musical mesmo, um tambor fazendo isso, uma harpa fazendo aquilo, um piano fazendo aquela outra frase, e nesse momento da pandemia eu pude fazer isso. Estruturar o tema e fazer a pré-produção das músicas.
Desafio maior foi gravar os instrumentos, porque pra mim é muito novo essa linguagem, de estar tocando balafon, de estar tocando harpa, de estar aprendendo. Isso tudo são estudos. A gente fala que são temas, mas são estudos, isso aí a gente tá embebendo a caminhada. Então os desafios foram gravar os instrumentos, arranjar, fazer com que esses instrumentos casassem com outros , por exemplo, a mbira casar com o piano, já que esses instrumentos de linguagem africana usam outros tipos de afinação, não essas afinações padrões; dó, ré,mi, fá,sol,lá,si,dó; que a gente conhece. Então, casar isso tudo num arranjo musical foi muito difícil. Casar duas frases de balafon e tocar no tempo, no pulso. Mas a gente pode aproveitar bem porque o nosso produtor musicas,o Vilela, foi muito empenhado , muito dedicado, deixou o estúdio de portas abertas para fazer o que quiséssemos, testar, ficou bom, volta.
Esse lance da voz também, né, nunca tinha cantado, gravado voz, primeira vez, então isso pra mim foi muito desafiador, o canto do Ijexá pra Oxum. Mas graças ao Orixá deu tudo certo.
RT4 – O que você espera que os ouvintes sintam ou experimentem ao ouvir suas músicas? Existe uma mensagem específica que você quer transmitir?
Diogo: Que se sintam bem,que se sintam agradáveis, confortáveis,tranquilos e em paz quando ouvir a nossa musicalidade, nosso EP. Cada um se expressa de uma maneira, mas que possa transmitir uma boa energia, essa é a principal ideia. Abrir esse leque de que nós podemos ter outras instrumentações, outros tipos de instrumentos, e tá a gente expressando essa musicalidade também. Então pra mim isso é muito importante. que as pessoas se sintam bem. A mensagem é de paz, é de amor, é de transformação e justiça no Caçador. Vamos pegar o exemplo de um Caçador. Não desse caçador que a gente conhece hoje, esse caçador que a gente falando de caça predatória, não . É um outro tipo de divisão de caçador, é aquele que sai pra caçar e traz o boi pra comunidade. Caçador que se coloca para comunidade estar sempre confortável, em paz e fluindo, com as coisas poderem estar acontecendo de maneira natural.
RT5 – Como você vê sua evolução como músico desde o início da sua carreira até agora? Existem mudanças significativas em sua abordagem criativa ou na forma como você se apresenta musicalmente?
Diogo: Esse lance da evolução como músico é uma busca constante, né? É aquele lance de estar andando para frente mas sempre olhando para trás. E graças ao Orixá que me proporcionou poder conhecer uma musicalidade que é mais a minha cara, que é mais a minha ideia. Que é mais do que eu me sinto confortável pra talvez transmitir a mensagem. Então, tudo que foi feito é válido demais, porque um apoia o outro. É muito importante a gente estar sempre nesse estudo, nessa busca, a arte, a educação, a linguagem da capoeira. Tudo isso influencia para gente evoluir, o candomblé de Ketu, o candomblé de Angola, tudo influencia, e gente trazendo para nossa musicalidade,né. Porque no inicio eu tocava teclado, e hoje em dia o teclado é um instrumento que a gente não abandonou, nunca, mas hoje ele é mais usado como suporte para criar um arranjo, um acorde, uma melodia, mas ele também tá presente no EP, e isso só evidencia as mudanças significativas demais. Agradeço demais ao Orixá por isso, por ter essa oportunidade de poder conhecer um pouquinho mais dentro do terreiro de candomblé,tá envolvido e sendo iniciado nessa prática,poder conhecer os ritmos advindos desses locais porque são eles que dão base, eu acho, para todos os ritmos que existem no Brasil.Poder começar a buscar também o entendimento da musica do Mali, da música da Africa, porque a gente entende que tudo isso que tá aqui no Brasil é Africa, não tem como a gente fugir. Então pra mim, chegar perto das minhas raízes, dos meus antepassados, é aquilo que eu falo, antes da raíz vem a semente, quanto mais eu puder chegar perto, a minha musicalidade vai evoluir,quanto mais eu voltar no tempo, a minha musicalidade vai nesse movimento de volta.
RT6 – Você tem uma fala muito potente a respeito da sua relação com a música que é: “Quando eu estou com esses instrumentos, eu fico mais preto.” Como você explica a conexão com a sua ancestralidade que a música te proporcionou?
Diogo: Pergunta difícil de responder, como explicar a ancestralidade. Quem veio antes de mim, minha mãe, meu pai, meus avós, meus bisavós, todos eles são muito importantes pra essa caminhada, porque são neles que eu vou pegar. Pegar no bom sentido, de absorver essa informação que como que era antes, pra gente continuar mantendo o legado. Quando a gente joga uma capoeira, a gente tá conectado, quando a gente toca um tambor, grita um canto, bate um samba, a gente tenta trazer isso diariamente, não separa nada, musica, religiosidade, capoeira e tambor, é tudo no mesmo meio . Eu só agradeço porque são esses elementos que estão me proporcionando a conectar com esses instrumentos, e aprimorando a musicalidade, chegando mais no tom ,então tem que agradecer muito.
RT7 – Quais são seus próximos passos após o lançamento?
Diogo: Quais são os próximos passos. O próximo passo é a gente cair bem nessa divulgação, fazer um trabalho bem bonito, divulgar legal na plataforma, nos espaços de cultura e depois ir pro ao vivo, e no ao vivo colocar essa musicalidade, essas composições, outras composições. Composições de amigos, composições clássicas da MPB, composições de terreiro, e fazer isso tudo ao vivo, com um quarteto, um quinteto, uma parada bem bacana, bem legal. Misturando uma onda teatral, musical e por enquanto é isso. Lançamento, divulgar bastante e depois ao vivo, e aí rodar tudo quanto é lugar do mundo que nos chamar – ah vem aqui pra Amsterdã agora tocar – vamo simbora, vamos juntar 4 pessoas – ah! vem aqui pra Florianópolis, Belo Horizonte – aquela turnê,que o artista gosta de fazer, vamos ver se a gente consegue emplacar essa. Mas a ideia é essa também. E talvez quem sabe mais futuramente a gente lançar uma campanha de financiamento coletivo e colocar esse ep em formato vinil, não só no digital. O lance agora é lançamento e tocar.
Você pode conferir o EP do Diogo nas principais plataformas de streaming:
Diogo Veiga é músico, arteeducador, multiinstrumentista. Pesquisa instrumentação africana e musicalidade afrocentrada, ou seja, que se baseia na música ancestral feita há séculos na África. Sua produção autoral busca uma expressão que o representasse mais, que falasse de suas alegrias e dores, que tivesse a sua cor. Instagram. Facebook.
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